Num domingo qualquer, os pais levaram a menina ao zoológico. Ela viu patos,
e meninos, e macacos prego, e palavras, e orangotangos... Gostou muito dos
jacarés. Teve medo e gostou. Quis ver mais tempo. Levou para casa. Aquele
pedacinho de gente gostou tanto dos dentuços que riscou de giz de cera um
corpão jacarenho na parede da sala de casa, de canto a canto. Brincou, e
brincou muito de riscar a parede. Depois soltou o lápis e foi procurar outra
coisa para descobrir. Na cozinha achou formiguinhas pequeninas bem diferentes
das que tinha visto no zôo, ficou olhando o caminhinho indiano que faziam, descobriu
que a casinha ficava numa fissura do azulejo florido, pensou como seria morar
ali... Perto da torneira meio dourada da pia... Agora ela já tava quase fora de
casa, era o quintal da casa. Ela encontrou uma pinha madura no pé. a pinha
grande se esbagaçava naquele calor. A menina gostava de comer coisas brancas.
Leite, aveia, iogurte, tapioca... Só não ia muito com a cara do queijo-qualho,
gostava mais do queijinho amarelo de manteiga. Brincou na terra e depois foi
lavar as mãos na cozinha, subiu num banquinho que já ficava posto para ela.
Abriu a torneira meio doirada, a água assustou uma barata que saiu do ralo, a
barata assustou de leve a menininha, mas não muito - A menininha era um
'moleque'. teve impulso de pegar a barata na mão, mas era um moleque bondoso, e
achou, que era mais certo, a barata ser livre. A barata era voadora, saiu pela
porta do quintal, a menininha era danada, acompanhou. O pesinho tava sujo,
contrastando com o cor-de-rosa da "sandalhinha de princesa", e as
unhas bem rombudinhas que o pai cortava de obsessão. A barata pousou pousuda
perto do lixo orgânico que estrumava o jovem pé de pinha que já dava tanto. Ela
achou bonito, a barata ser livre. Lembrou dos animais do zoológico... Eram
bonitos, mas, com exceção dos jacarés, que pareciam sábios famintos, os outros
pareciam bem descontentes com a jaula. Ela pensou que realmente não era bom
estar preso, e que não gostava quando mandavam ela pensar sozinha dentro do
quarto das tralhas. O pensamento dela tava voando... Um ventinho levou umas
folhas do chão. Cadê a barata?! Perguntou a si mesma. - Eita! A barata! a
lagartixa! Vai comer a barata!?... Era a coisa mais incrível, ela pensou. E lá
estava a lagartixa com aquela barata engasgada, cheia de casca, agonizante...
Aquela lagartixa pequena... Era igual o jacaré!
araraíra
maria do nascimento,
Recife,
setembro de 2009.